quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

1º de Janeiro


A gente começa o ano como quem começa a ler um romance cujo enredo nos interessa muito por ser a história da nossa própria vida.

Mario Quintana


Foto: Isabel Guerra - Por tua palavra viverei na claridade.

EXPRESSÕES


A expressão mais idiota que existe é "adeusinho."

Mario Quintana


Foto: Magritte - La Promesse

sábado, 26 de dezembro de 2009

MAGIAS


Conheço uma cidade azul.

Conheço uma cidade cor de ferrugem.

Na primeira, há helicópteros pairando...

Na segunda, espiam de seus esconderijos os olhos das ratazanas.

No entanto

é a mesma cidade

e,

onde a gente estiver,

será sempre uma alma extraviada em labirintos escusos

ou, então,

uma alma perdida de amor...

Sim! Por ser habitado por almas

é que esse nosso mundo é um mundo mágico...

onde cada coisa – a cada passo que se der

vai mudando de aspecto...

de forma

de cor...

Vai mudando de alma!



Mario Quintana

PREGUIÇA


Certa vez abalancei-me a um trabalho intitulado “Preguiça”. Constava do título e duas belas colunas em branco, com a minha assinatura no fim. Infelizmente não foi aceito pelo supercilioso coordenador da página literária.

Já viram desconfiança igual?

Censurar uma página em branco é o cúmulo da censura.


(Caderno H)

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Estufa



Que imaginação depravada têm as orquídeas! A sua contemplação escandaliza e fascina. Vivem procurando e criando inéditos coloridos, e estranhas formas, combinações incríveis, como quem procura uma volúpia nova, um sexo novo...


Mario Quintana

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Astrologia


Minha estrela não é a de Belém:
A que, parada, aguarda o peregrino.
Sem importar-se com qualquer destino
A minha estrela vai seguindo além...

— Meu Deus, o que é que esse menino tem? —
Já suspeitavam desde eu pequenino.
O que eu tenho? É uma estrela em desatino...
E nos desentendemos muito bem!

E quando tudo parecia a esmo
E nesses descaminhos me perdia
Encontrei muitas vezes a mim mesmo...

Eu temo é uma traição do instinto
Que me liberte, por acaso, um dia
Deste velho e encantado Labirinto


Este poema foi musicado por Lui Coimbra, e está no seu CD "Ouro e Sol".

Vale a pena ouvir.


A foto - Visconde de Mauá - RJ/MG



sexta-feira, 6 de novembro de 2009

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Canção do dia de sempre




Tão bom viver dia a dia...
A vida, assim, jamais cansa...

Viver tão só de momentos
Como essas nuvens do céu...

E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência... esperança...

E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu.

Nunca dês um nome a um rio:
Sempre é outro rio a passar.

Nada jamais continua,
Tudo vai recomeçar!....

E sem nenhuma lembrança

Das outras vezes perdidas,

Atiro a rosa do sonho

Nas tuas mãos distraídas...



Mario Quintana

Alma Errada


Há coisas que a minha alma, já tão mortificada, não admite:

assistir novelas de TV

ouvir música POP

um filme apenas de corridas de automóvel

uma corrida de automóvel num filme

um livro de páginas ligadas

porque, sendo bom, a gente abre sofregamente a dedo:

espátulas não há... e quem é que hoje faz questão de virgindades...

E quando minha alma estraçalhada a todo instante pelos telefones

fugir desesperada

me deixarás aqui,

ouvindo o que todos ouvem, bebendo o que todos bebem,

comendo o que todos comem.

A estes, a falta de alma não incomoda. (Desconfio até que minha pobre alma

fora destinada ao habitante de outro mundo).

E ligarei o rádio a todo volume,

Gritarei como um possesso nas partidas de futebol,

Seguirei, irresistivelmente, o desfilar das grandes paradas do Exército.

E apenas sentirei, uma vez que outra,

a vaga nostalgia de não sei que mundo perdido...



Mario Quintana

Ah! É?


Acabo de ler, num artigo de jornal, que pertenço à “antiga geração”. Deve ser por isso mesmo que me sinto tão arejado como um velho casarão de vidraças partidas.


Mario Quintana (Porta Giratória)

sábado, 26 de setembro de 2009

Alguns trechos de entrevistas com Mario Quintana.



Cristina Serra: Por que você gosta tanto de escrever à noite?
Quintana: Sou um lobisomem da poesia. Escrevo de meia-noite em diante, até às três ou quatro horas. Às vezes, a poesia vem nas ocasiões mais impróprias e eu tomo nota do relâmpago num papelzinho; outras vezes, me esqueço pelo caminho. Se eu não esqueço, escrevo à noite, no silêncio. À noite, a gente só é visitado por fantasmas e eles são silenciosos...

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Patrícia Bins: O futuro, como o imaginas?
Quintana: O futuro é uma espécie de banco, ao qual vamos remetendo, um por um, os cheques de nossas esperanças. Ora! Não é possível que todos os cheques sejam sem fundos...

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Ivete Brandalise: Mario, este homem que faz poema, que faz música com suas palavras. Que músicas foram incorporadas no seu patrimônio afetivo?
Quintana: Eu não gosto de música só com açúcar. Eu não gosto de música de ópera.

Ivete Brandalise: Por que não?
Quintana: Porque parece namoro de gato, não termina nunca e não deixa a gente dormir.

Ivete Brandalise: Que músicas fazem a tua cabeça?
Quintana: A 4ª sinfonia de Maller, pois ela é uma música angustiada e eu, como todos neste fim-de-século estamos angustiados. Gosto também de “Cânticos Peregrinos", de Wagner e a "Canção dos Barqueiros do Volga".

Ivete Brandalise: Tu falaste na angústia de Maller. Tu achas que a angústia ajuda a criar?
Quintana: A angústia ajuda a criar porque um poema sempre se faz num estado de inquietação, que não deixa de ser angústia. Embora não seja uma angústia de desespero, mas uma angústia que traz esperança.

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JB: Para o senhor qual o valor de um amigo? Um amigo será mesmo um anjo disfarçado de ser humano?
Quintana: Os chatos se dividem em duas categorias: os chatos propriamente ditos e os amigos, que são os nossos chatos prediletos...

JB: Seus poemas nos lembram o garoto sapeca que já fomos um dia, roubando doces das janelas.
Quintana: Doce só é bom mesmo quando é roub
ado.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Um encontro com ele


Foi no meio da rua. Uma parada. Um abraço. O outro perguntou-lhe:
- Para onde vai o senhor?
- Para o outro lado.


Mario Quintana



Foto: Foto copiada do blog de Fábio Rocha - Uma homenagem dos argentinos ao Poeta.

Um Passeio na Mata


Ouço, num primitivo espanto, os gritos mais insólitos. Não sei o nome de nenhum desses pássaros, de nenhuma dessas árvores. Olho, agora, esta flor: apenas sei que é amarela. Meu pensamento, ou seja lá o que for, é simplesmente composto de adjetivos, como nos primeiros dias da Criação.

Mario Quintana (Caderno H)

Poeminha Sentimental



O meu amor, o meu amor, Maria
É como um fio telegráfico da estrada
Aonde vêm pousar as andorinhas...
De vez em quando chega uma
E canta
(Não sei se andorinhas cantam, mas vá lá!)
Canta e vai-se embora
Outra, nem isso,
Mal chega, vai-se embora,
A última que passou
Limitou-se a fazer cocô
No meu pobre fio da vida!
No entanto, Maria, o meu amor
É sempre o mesmo:
As andorinhas é que mudam.

Mario Quintana

sábado, 29 de agosto de 2009

Só se deve morrer de puro amor...


Nunca ninguém sabe se estou louco para

rir ou para chorar.

Por isso o meu verso tem

Esse quase imperceptível tremor...

A vida é louca, o mundo é triste:

Vale a pena matar-se por isso?

Nem por ninguém!

Só se deve morrer de puro amor...


Mario Quintana

A casa fantasma


A casa está morta? Não: a casa é um fantasma, um fantasma que sonha com a sua porta de pesada aldrava, com os seus intermináveis corredores que saíam a explorar no escuro os mistérios da noite e que as luas, por vezes, enchiam de um divino assombro... Sim! agora a casa está sonhando com o seu pátio de meninos pássaros. A casa escuta... Meu Deus! A casa está louca, ela não sabe que em seu lugar se ergue um monstro de cimento e aço: há sempre uma cidade dentro da outra e esse eterno desentendido entre o Espaço e o Tempo. Casa que teimas em existir – a coitadinha da velha casa! Eu também nunca consegui afugentar meus pássaros.


Mario Quintana

O ponto de interrogação


Que artista teria inventado o nosso ponto de interrogação? Ele já tem a forma de uma orelha à escuta

As bruxas de pano



As bruxas de pano

Tão maternalmente embaladas

Pelas menininhas pobres

São muito mais belas

Do que as bonecas suntuosas como princesas - orgulho das vitrinas...

Essas humildes bruxas de pano

Com seus olhinhos de conta

Suas bocas tão mal desenhadas a tinta

São mais belas porque mais amadas!


Mario Quintana

sábado, 15 de agosto de 2009

Nomes Feios



Início de mais uma madrugada. Mario chega à pensão em que morava, na Barros Cassal, perto da Avenida Independência, e é mal recebido pelos cachorros. Reage aos latidos com todos os palavrões disponíveis. Na calçada, os pintores Waldeny Elias e Gastão Hofstaetter, que passaram a noite bebendo com ele e vieram deixá-lo em casa, assistem à cena. Em meio à gritaria, abre-se a janela e surge a dona da pensão:
- Mas o que é isso, seu Mario! O senhor, um homem tão culto, dizendo essas barbaridades!
Ele se defende:
- É que a senhora não sabe os nomes que os seus cachorros estão me dizendo…

Canção Azul


Triste, Poeta, triste a florzinha azul que sem querer pisaste no teu caminho...
Miosótis,  disseste, inclinado um instante sobre ela.
E ela acabou de morrer, aos poucos, dentre a relva úmida.
Sem nunca ter sabido que se chamava miosótis.
Nem que iria impregnar, com seu triste encanto,
O teu poema daquele dia...

Mario Quintana

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Que crepúsculo fez hoje!


De uma feita, estava eu sentado sozinho num banco da Praça da Alfândega quando começaram a acontecer coisas incríveis no céu, lá pelas bandas da Casa de Correção: havia tons de chá, que se foram avinhando e se transformaram nuns roxos de insuportável beleza. Insuportável, porque o sentimento de beleza tem de ser compartilhado.
Quando me levantei, depois de findo o espetáculo, havia umas moças conhecidas, paradas à esquina da Rua da Ladeira.
— Que crepúsculo fez hoje! — disse-lhes eu, ansioso de comunicação.
— Não, não reparamos em nada — respondeu uma delas. –– Nós estávamos aqui esperando o Cezimbra.
E depois ainda dizem que as mulheres não têm senso de abstração...
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Mario Quintana

Mudança de Temperatura

Mudança de temperatura

Nos fios telegráficos pousaram uma, duas, três. Quatro andorinhas.
Olham de um lado e outro... Irão partir?
Sobre as cercas rasas do arrabalde, os girassóis espiam como girafas...
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sábado, 1 de agosto de 2009

As nuvens e os sonhos


Rua da Praia

Homenagem a Quintana junto a Carlos Drummond de Andrade na rua da Praia em Porto Alegre.


Drummond tinha um humor poético que confessava e agredia.
Quintana confessava para justamente acalmar a briga.

Se Carlos Drummond mostrou a distorção pela multiplicidade psicológica,
Quintana procurava harmonizar e reunir os cacos da vidraça.

Drummond é desconfiado, de olhar oblíquo.
Quintana é debochado, de olhar confiante.

Drummond é longo como um vício.
Quintana é breve como uma virtude.

Drummond se mostrou engajado nas questões urbanas e urgentes de sua época. Quintana procurou não ser do seu tempo, e sim do seu lugar.

Drummond traz o sentimento de despoder biográfico.
Quintana se articula no sentimento de posse do eu, da vaidade generosa, que se reparte e não se economiza.
O primeiro duvida do espelho, o segundo duvida de quem se vê no espelho.

Drummond se ausentava do poema, tal velório.
Quintana não se ausentava do poema, tal festa de aniversário.

Se Drummond mostrou o embate entre Itabira, sua cidade natal, com as capitais que viveu, expressando a retração do homem simples e seu desconforto metafísico na metrópole,
Quintana achou sua cidade natal, Alegrete, em Porto Alegre. Ele desenterrou Alegrete na capital gaúcha, apresentando um recolhimento interior e apaziguador pelos becos e sobrados, pelas ruas ainda cicatrizando as linhas do bonde. Não houve conflito entre o alto e baixo, ruínas de ventre. Sua cidade residia nos esconderijos atemporais, nos desvãos, nas casas antigas. Porto Alegre bastou-lhe como uma maquete ancestral, um rascunho de mapa. Um impulso para recuar e se destrançar nos labirintos escuros.

Depoimento de Fabrício Carpinejar - poeta e jornalista
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segunda-feira, 27 de julho de 2009

O motivo da rosa



A rosa, bela Infanta das sete saias
e cuja estirpe não lhe rouba, entanto,
o ar de menina, o recatado encanto
da mais humilde de suas aias,
a rosa, essa presença feminina,
que é toda feita de perfume e alma,
que tanto excita como tanto acalma,
a rosa... é como estar junto da gente
um corpo cuja posse se demora
- brutal que o tenhas nesta mesma hora,
em sua virgindade inexperiente...
rosa, ó fiel promessa de ventura
em flor... rosa paciente, ardente, pura!

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Hoje é outro dia


Quando abro cada manhã

a janela do meu quarto

É como se abrisse o mesmo livro

Numa página nova...


Mario Quintana

quarta-feira, 22 de julho de 2009

sexta-feira, 17 de julho de 2009

OS NOMES




Como não lhes interessa o que parece inútil, os campônios não dão importância às flores do campo. É o que parece. Mas a gente fica a perguntar-se como é que essas flores silvestres conseguiram então ter nomes populares: margaridas, amores-perfeitos, coisas assim!


(Porta Giratória)

O poeta dedicou-lhe um poema:




Meu Quintana, os teus cantares
Não são, Quintana, cantares:
São, Quintana, quintanares.
Quinta-essência de cantares...
Insólitos, singulares...
Cantares? Não! Quintanares!


Manuel Bandeira

Ilustraça: Faccincani Giardino

Sem sapatos


Tão Linda e Serena e Bela



Tão lenta e serena e bela e majestosa
vai passando a vaca
Que, se fora na manhã dos tempos, de rosas a coroaria
A vaca natural e simples como a primeira canção
A vaca, se cantasse,
Que cantaria?
Nada de óperas, que ela não é dessas, não!
Cantaria o gosto dos arroios bebidos de madrugada,
Tão diferente do gosto de pedra do meio-dia!
Cantaria o cheiro dos trevos machucados.
Ou, quando muito,
A longa, misteriosa vibração dos alambrados...
Mas nada de superaviões, tratores, êmbolos
E outros truques mecânicos!

Mario Quintana

Foto: A rua onde eu nasci.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Vales




Na época em que trabalhava na Editora Globo ele andava sempre duro. O salário terminava bem antes do fim do mês, vivia pedindo vales de adiantamento. Em determinado dia, o caixa chiou:
- Mas seu Mario, o senhor já tem um monte de vales!
Quis saber, com aquele sorriso maroto:
- Afinal, são vales ou são montes?

Do livro “Ora Bolas – O humor cotidiano de Mario Quintana” de Juarez Fonseca

Um velho tema


Há mortos que não sabem que estão mortos - eis um velho tema desses relatos fantásticos e fantasmais que a gente lê sem cansar nunca. Como se não houvesse coisas muito mais impressionantes em nosso próprio mundo! Uma história, por exemplo, que começasse assim: há vivos que não sabem que estão vivos...


Mario Quintana
Ilustração -Edward Munch

Um poço de ternura


Às vezes, era temperamental, imprevisível, capaz de sumir, na presença de quem quer que fosse, a cavalo de uma espiral de seu inapagável cigarro. Paciência! Mesmo assim, lembro inúmeros encontros, sobretudo os dos últimos dez anos de vida, quando descobri que havia dentro de Quintana um poço de ternura, também para os amigos.
Sua personalidade magnética produzia, de modo perdulário, poesia falada. Em qualquer encontro com amigos, surgiam anedotas e provérbios exemplares. Era frasista inveterado, da linhagem de Otto Lara Resende, alguém precisava sair atrás dele anotando. Desconcertava com o raciocínio analógico, virando o senso comum de ponta-cabeça.
Em seu espelho mágico, os leitores saíam transfigurados: "Sorri com tranqüilidade/ Quando alguém te calunia./ Quem sabe o que não seria/ Se ele dissesse a verdade...".
Divertia-se inventando histórias e assustava os interlocutores ao demorar a esclarecer que eram mentiras.
Apresentava um afiado radar da aproximação dos chatos. "Identificava um chato a distância, especialmente os aduladores sem conhecimento de causa. Trocava de calçada se preciso", recorda Elena.

Armindo Trevisan, poeta gaúcho, fala sobre o amigo Mario Quintana
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Um encontro com ele


Foi no meio da rua.
Uma parada.
Um abraço.
O outro perguntou-lhe:
- Para onde vai o senhor?
- Para o outro lado.


Mario Quintana

Foto tirada em Buenos Aires, eu peguei do blog do Fabio Rocha (http://dabusca.blogspot.com)
Os argentinos fizeram uma homenagem a Mario Quintana, dando o seu nome a uma ponte.

sábado, 11 de julho de 2009

Quintana por ele mesmo...



O texto abaixo foi escrito pelo poeta para a revista Isto É de 14/11/1984

Nasci em Alegrete, em 30 de julho de 1906. Creio que foi a principal coisa que me aconteceu. E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo. Bem! eu sempre achei que toda confissão não transfigurada pela arte é indecente.

Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão. Ah! mas o que querem são detalhes, cruezas, fofocas... Aí vai!

Estou com 78 anos, mas sem idade. Idades só há duas: ou se está vivo ou morto. Neste último caso é idade demais, pois foi-nos prometida a Eternidade.

Nasci no rigor do inverno, temperatura: 1grau; e ainda por cima prematuramente, o que me deixava meio complexado, pois achava que não estava pronto. Até que um dia descobri que alguém tão completo como Winston Churchill nascera prematuro - o mesmo tendo acontecido a sir Isaac Newton!

Excusez du peu... Prefiro citar a opinião dos outros sobre mim. Dizem que sou modesto. Pelo contrário, sou tão orgulhoso que acho que nunca escrevi algo à minha altura. Porque poesia é insatisfação, um anseio de auto-superação. Um poeta satisfeito não satisfaz. Dizem que sou tímido. Nada disso! sou é caladão, introspectivo. Não sei porque sujeitam os introvertidos a tratamentos. Só por não poderem ser chatos como os outros?

Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese. Outro elemento da poesia é a busca da forma (não da fôrma), a dosagem das palavras. Talvez concorra para esse meu cuidado o fato de ter sido prático de farmácia durante cinco anos. Note-se que é o mesmo caso de Carlos Drummond de Andrade, de Alberto de Oliveira, de Érico Veríssimo - que bem sabem (ou souberam) o que é a luta amorosa com as palavras.


Se não foram os gatos...




quinta-feira, 9 de julho de 2009

Os Poemas


Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto;
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...



Mario Quintana